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O nervo vago e a autorregulação emocional

  • Foto do escritor: Cláudia Casavecchia
    Cláudia Casavecchia
  • 15 de out.
  • 5 min de leitura

 “Embora possamos pensar que nossos cérebros estão no comando, o coração de nossa experiência diária e a maneira como navegamos pelo mundo começam em nossos corpos, com o sistema nervoso autônomo. É nossa biologia que molda nossas experiências de segurança e conexão.” Deb Dana


A história do sistema nervoso autônomo (SNA) começou há cerca de 500 milhões de anos, com um peixe ancestral chamado placodermo, a partir do qual se originou a primeira ramificação do sistema parassimpático, o vagal dorsal. Um exemplo desse funcionamento é a tartaruga: ela transita lentamente pelo mundo e, quando se assusta, recolhe-se em sua carapaça, permanecendo imobilizada até que volte a se sentir segura.


Cerca de 400 milhões de anos atrás, outro peixe extinto, o acantodiano, trouxe uma nova estrutura: o sistema nervoso simpático. Com ele, as ações de lutar ou fugir tornaram-se possíveis. É o que acontece quando um peixe foge do ataque de um tubarão, um exemplo primitivo da ativação simpática. Por fim, há aproximadamente 200 milhões de anos, surge o segundo ramo do sistema parassimpático, o vagal ventral, exclusivo dos mamíferos. Ele nos permite sentir segurança, estabelecer vínculos e comunicar-nos. É o sistema que nos conecta, como na conversa entre amigos ou no carinho com um animal de estimação.


Assim, o SNA é formado por dois grandes sistemas: simpático e parassimpático. O nervo vago é o principal mediador do parassimpático, com seus dois ramos, dorsal e ventral. Juntos, eles formam três caminhos autônomos que moldam nossas respostas fisiológicas e emocionais. A cada nova estrutura que surgia ao longo da evolução, a anterior era incorporada, tornando o sistema cada vez mais complexo.

 

Sistema Nervoso Autônomo

↳ Sistema Nervoso Simpático

↳ Sistema Nervoso Parassimpático (Vago Ventral e Vago Dorsal)

 

Na Teoria Polivagal, o termo vagal refere-se ao nervo vago, um feixe de nervos que se origina no tronco cerebral e percorre grande parte do corpo, influenciando diversos órgãos. O nome “vago” vem do latim vagus, que significa andarilho, pois é o mais longo dos nervos cranianos. O nervo vago é o décimo dos doze pares cranianos (X). Apenas sua ramificação do lado direito conecta-se diretamente ao coração, formando o chamado freio vagal.


Do tronco cerebral, ele desce pelo pescoço, passa atrás da carótida e se ramifica ao longo da traqueia, pulmões, coração, abdômen e sistema digestivo. Cerca de 80% das informações viajam do corpo para o cérebro, e apenas 20% no sentido contrário.

 

Os ramos do nervo vago


“Quando estamos desconectados de nossos corpos, também estamos desconectados da capacidade de sintonizar as informações importantes que estão sendo enviadas do corpo para o cérebro através da via vagal.” Deb Dana.

 

O diafragma é o marco divisório entre os dois ramos vagais. Abaixo do diafragma, atua o vago dorsal, responsável por regular a digestão e o repouso. Em modo de sobrevivência, ele nos leva ao colapso e à imobilização, um estado de desconexão e entorpecimento, no qual sentimos como se estivéssemos presentes, mas sem realmente estar. Tudo desacelera para poupar energia, inclusive o processo digestivo. Acima do diafragma, domina o vago ventral, o sistema da segurança, regulação e conexão. Quando ele está ativo, a respiração é fluida, o coração ajusta seu ritmo e a atenção se volta para o contato com o outro e com o mundo. É o lugar do bem-estar e da presença.

 

O Freio Vagal

 

O freio vagal é um circuito ventral que conecta o tronco cerebral ao nó sinoauricular do coração, regulando seus batimentos e o ritmo respiratório. A cada inspiração, o freio relaxa levemente, acelerando o coração; na expiração, ele retoma o controle, desacelerando-o. Podemos imaginar esse processo como o freio de uma bicicleta em descida, alternando momentos de maior e menor pressão. Sua função é permitir que o sistema simpático seja mobilizado sem que o corpo entre em luta ou fuga — ou seja, mantendo a energia disponível, mas dentro de uma zona de segurança.

 

A Energia do Sistema Simpático


“A energia do sistema nervoso simpático é vital para nossa capacidade de transitar pelo mundo.” Deb Dana.


O sistema simpático emerge da medula espinhal nas regiões torácica e lombar. Ele regula o fluxo sanguíneo, o ritmo cardíaco e o padrão respiratório. Quando trabalha em cooperação com o vago ventral, traz vitalidade e expressividade às experiências. Mas, quando nos desconectamos do freio vagal, o sistema simpático assume o controle, levando-nos ao estado de luta ou fuga. Nessa ativação, entra em ação o eixo HPA (hipotálamo-hipófise-adrenal), responsável pela liberação de adrenalina e cortisol.


Um estresse contínuo mantém esse eixo ativo, criando uma sensação de turbilhão interno, uma busca incessante por calma. Imagine uma lista interminável de tarefas, o corpo reage mantendo-se em alerta, sem encontrar repouso. Historicamente, viver em tribos era fundamental para nossa sobrevivência. Quando ancorados no estado ventral, sentimos segurança e enxergamos possibilidades de vínculo. Mas, ao migrarmos para o simpático, o mundo se torna perigoso e hostil, entramos em hipervigilância.

 

Movendo-se entre estados


“Quando está ancorado na energia reguladora do estado vagal ventral, o sistema nervoso autônomo está em equilíbrio, e experimentamos o bem-estar que vem com a sensação de homeostase saudável.”

Deb Dana


Quando saímos da regulação ventral, o primeiro movimento é rumo ao sistema simpático, mobilizando-nos para agir e nos proteger. Se o perigo persiste, o corpo desliga e assim mergulhamos no estado vagal dorsal, de imobilização e desconexão. Essa sequência é previsível e rastreável: podemos aprender a reconhecer nossos movimentos entre os estados e encontrar o caminho de volta à regulação. O problema não é sair da regulação, mas não conseguir retornar. Quando isso acontece, ficamos presos na hiperativação simpática ou no desligamento dorsal.

 

Retornando à Regulação

 

Como o sistema nervoso foi formado em camadas evolutivas, para sair do colapso e retornar à segurança, é necessário passar pela mobilização simpática, sem se deixar capturar por ela. Um momento de mobilização segura pode assumir muitas formas: um pequeno impulso de energia, um suspiro, o desejo de movimento, singelos sinais de vida que indicam o caminho de volta à regulação.


Podemos visualizar nossos estados autônomos como paisagens internas: ensolaradas, tempestuosas, nubladas ou nebulosas. Cada uma representa um modo de funcionamento do corpo. O SNA nos paralisa, ativa e regula. Quando o vago ventral está ativo, o simpático e o dorsal funcionam em harmonia, permitindo ação com segurança e descanso com tranquilidade. Já quando operam em modo de sobrevivência, despertam as respostas primárias de luta, fuga ou desconexão. Se nos observarmos atentamente, conseguiremos progressivamente desenvolver o sentido da neurocepção, que nos permite dectectar as pendulações do nosso sistema nervoso autônomo, para assim compreender as situações e relacionamentos que nos despertam medo, insegurança, receio, assim como tudo aquilo que nos trás segurança, conforto e conexão.

 

Cláudia Casavecchia

DANA, Deb. Ancorado. São Paulo: Editora Alaúde, 2025.

 
 
 

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